REFUGIADOS UCRANIANOS EM TÁBUA
Apreciam a vida calma da vila de Tábua, o sol e o “belo lago” por onde passaram, estão surpreendidos com a forma solidária e fraterna como foram recebidos, mas as imagens do horror que viveram na Ucrânia custam a sarar.
“Apreciamos esta calma que transparece em Tábua. É um grande contraste com o ambiente de guerra e medo que vivemos na Ucrânia”, diz Merjen, uma jovem de 28 anos,que integra um grupo de cerca de trinta refugiados que Tábua acolheu, na sua maioria, jovens estudantes. Chegaram ao fim da tarde da passada sexta-feira, depois de uma viatura dos bombeiros os ter ido buscar ao aeroporto de Lisboa, vindos da Polónia.
Encontram-se agora alojados no antigo lar da Santa Casa da Misericórdia e tecem rasgados elogios à forma como foram acolhidos: ”Estamos aqui há praticamente há 24 horas (a reportagem teve lugar durante a tarde de sábado na Praça do Tribunal, onde, casualmente, os encontrámos numa esplanada, desfrutando um sol quente e radioso). ”Fantástico este tempo e aquele lago por onde passamos é muito bonito”, diz Merjen. Estudava Relações Diplomáticas em Kiev e a guerra cortou de forma abrupta os seus sonhos. Conta que vida deles era muito boa antes de “Putin atacar e agora vamos ter de começar tudo do zero ”.Não esquece o horror de ver o céu da capital ucraniana cinzento do fumo das bombas, os bombardeamentos, o medo que sentiu quando teve de fugir para as galerias do metro para tentar sobreviver enquanto as bombas caiam, naquela altura, em alvos militares.
“Demoramos algum tempo a sair da cidade, pois havia muitas filas de carros. A viagem até à fronteira com a Polónia demorou quatro dias e, pelo meio, íamo-nos cruzando com tanques ucranianos, dezenas deles”. Merjen defende que a NATO devia fechar os céus do seu país, de forma a impedir mais bombardeamentos por parte da aviação russa e não crê que, se tal acontecer, surja uma Terceira Guerra Mundial. “Ela já começou na Ucrânia com milhares de civis mortos, gente inocente, falando-se que mais de 500 crianças assassinadas. Para quê? É uma guerra estúpida”.
O grupo é liderado por Cristina Tavares, da Câmara Municipal, que nos explica que o grupo está a ser acompanhado por um gabinete específico do Município, que trata de toda a documentação e integração profissional. As empresas interessadas em contratar estes ucranianos podem fazê-lo através de uma plataforma criada pelo Centro de Emprego.
Mas as imagens de guerra dificilmente são esquecidas. Freiz, um estudante em Mariupol, cidade que foi invadida no dia 24 de fevereiro e que, segundo os últimos relatos, estará prestes a ser tomada pelos invasores russos, tem ainda a imagem gravada na sua mente daquele momento dramático de ver um amigo, que se encontrava ao seu lado, ser baleado .
Olena, a mais velha do grupo, 64 anos deixou a família em Karkiv. Passados estes dias, por vezes parece ouvir as bombas a cair, as imagens dos prédios a serem esventrados pela artilharia russa e só espera voltar a ver o filho que se encontra ainda naquela cidade por causa da lei marcial.
Tatyana (residente em Kharkov) ainda tem no subconsciente o barulho estridente das sirenes, e diz que parece estar a viver agora no paraíso ao encontrar este ambiente de perfeita tranquilidade em Tábua, uma vila muito bonita. “Dizem que o vosso país é o mais seguro da Europa”, sublinha.
Hassan, um outro estudante de Kiev, diz não compreender esta guerra em que as pessoas morrem aos milhares por nada, sem motivo aparente: “É só propaganda e mentiras quando Putin diz que desencadeou aquilo que chama de operação especial para liquidar os nazis. Os ucranianos são um povo pacífico, não são uma ameaça para a Rússia”. Apoia a integração da Ucrânia na União Europeia e acha que já se deveria ter dado há mais tempo, pois era uma forma de “impedir esta guerra”. Fica horrorizado ao ver nas TV as imagens dos seus compatriotas serem assassinados, de uma forma cruel, sem motivo aparente. ”É um crime de guerra matar civis e crianças apenas por puro prazer sádico. Espero que um dia venham a ser julgados”.
Se o conflito acabar e as condições melhorarem, muitos elementos deste grupo tencionam regressar ao seu país. “A Ucrânia é um belo país”, dizem. Não temos dúvidas, apesar do inferno que se vive nesta altura, com um futuro ainda muito indefinido, pois a guerra está para durar, cada vez com mais episódios cruéis.
Texto e fotos: José Leite
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