PARA ALÉM DA FALTA DE ÁGUA, AGRICULTORES PREOCUPADOS COM O AUMENTO EXORBITANTE DOS PRODUTOS PARA O SECTOR E DO PREÇO DA ELECTRICIDADE
PRESIDENTE DA CÂMARA DE TÁBUA RECUSOU PRONUNCIAR-SE A “O TABUENSE” SOBRE ESTE TEMA DE INEGÁVEL TRANSCENDÊNCIA PARA A POPULAÇÃO
Portugal está em seca meteorológica desde novembro de 2021 e a situação tem-se agravado. Com o inverno já a meio e sem uma gota de chuva a cair do céu, os caudais das barragens descem para níveis preocupantes expondo uma paisagem desoladora, que é mais comum, apesar de tudo, no verão do que durante a estação mais fria do ano.
Em janeiro, refere a atualização mais recente do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, houve um aumento significativo da área e da intensidade da situação de seca. Todo o território continental português estava em seca nesse mês, com 1% em seca fraca – na zona do Minho; 54% em seca moderada – sobretudo Norte, Centro e partes dos distritos de Santarém, Évora e Portalegre; 34% em seca severa – zona Oeste, sul do distrito de Santarém, zonas mais interiores do Alto Alentejo, parte da península de Setúbal e dos distritos de Beja e Faro; e 11% em seca extrema – metade dos distritos de Setúbal e Beja e quase toda a região do Algarve.
Uma situação que também afeta esta região de Tábua, se bem que nos últimos dias, principalmente no domingo passado, tenham caído alguns chuviscos, insuficientes para regar as culturas ou os pastos que alimentam o gado, ou fazer subir a água nos poços. A par dessa situação, assiste-se a um aumento exorbitante dos preços dos produtos usados na agricultura, como é o caso dos adubos que aumentaram em mais de cem por cento os seus preços, além dos custos de eletricidade.
Segundo os dados que nos foram disponibilizados – a Câmara Municipal de Tábua e o seu presidente não responderam a um email que enviámos para se pronunciarem sobre este tema que afeta a população tabuense, principalmente os agricultores – as águas da barragem da Aguieira terão descido cerca de 40 por cento da sua capacidade máxima (ver gráfico). Uma situação que se deve em parte ao facto de o Governo ter restringido o uso de várias barragens para produção de eletricidade e para rega agrícola.
Uma imagem de seca é bem visível ao percorrermos o leito do Mondego, principalmente no trajeto entre a Pedra da Sé e a Póvoa de Midões, onde a velhinha ponte que ligava os concelhos de Tábua e Santa Comba Dão quase que ressurgiu na sua estrutura inicial das profundezas da água, nesse local, anteriormente considerada bem profunda. O castanho seco da margem também domina a zona do Rio Dão, junto ao restaurante Cota Máxima, em Santa Comba Dão, o mesmo acontecendo nas margens do Rio Alva, junto à barragem das Fronhas, ressaltando o empedrado árido que ladeia o serpentear do leito cada vez menos caudaloso.
Em fevereiro não se preveem grandes alterações. O boletim de 27 de janeiro do IPMA avançava que seria”muito provável o agravamento da situação de seca meteorológica no final de fevereiro, em todo o território do continente”.
“Para a situação de seca diminuir significativamente ou mesmo cessar no mês de fevereiro, seria necessário que nas regiões do Norte e Centro ocorressem quantidades de precipitação superiores a 200/250 mm e na região Sul superiores a 150 mm, situação que somente ocorre em 20% dos anos”, diz o instituto de meteorologia.
Enquanto não chove, as imagens da seca no país mostram um cenário preocupante, lembrando como Portugal está cada vez mais exposto às alterações climáticas
ADUBOS AUMENTAM 100 POR CENTO
Segundo Aníbal Rodrigues, presidente da Agritábua, a seca e a inflação estão a ter efeitos na venda dos produtos pela cooperativa: “Subiu muito a alimentação animal e os preços dos adubos, agora muito utilizados na sementeira da batata, que passaram para o dobro. O ano passado comprei um saco de 25 quios por 7,90 euros e ontem custava 16, 90 euros. Ainda não fizemos o apuro mensal, mas estamos a vender menos artigos”, referiu o responsável pela cooperativa.
Acrescentou que, nesta altura, a seca ainda não se começou a sentir de uma forma severa, porque “ só agora começou a época das sementeiras, que estão algo atrasadas devido à geada que caiu nos últimos meses”. No entanto, se persistir este período de seca, a situação pode “tornar-se dramática”.
“Mas a barragem da Aguieira não é importante para o nosso regadio, só de Coimbra para baixo. Haver menos água está a refletir-se mais nos poços, furos, nascentes e fontanários. Por exemplo, na minha propriedade na Barrosa, a água no poço, que tem 17 metros de fundo, tinha por estes dias meio metro de altura”, referiu. E lembrou um episódio que testemunhou na característica fonte da mesma localidade: “Um senhor que costuma ir lá para encher garrafões com água nessa fonte, disse-me que, há quinze dias, demorava 3 minutos a encher um garrafão, agora já demora quase 5 minutos”, frisou Aníbal Rodrigues.
O Presidente da Agritábua não tem memória de uma seca como esta, desde os “tempos em que se compravam propriedades junto ao Mondego para cultivar milho e para as quais a água era transportada através de canais e rodas.
PRESIDENTE DA CÂMARA DE COIMBRA LANÇA APELO AO GOVERNO PARA QUE SEJA CONSTRUÍDA BARRAGEM DE GIRABOLHOS
O presidente da Câmara de Coimbra, José Manuel Silva, na última reunião do executivo que teve lugar a 7 de fevereiro, lançou um apelo ao próximo Governo para que complete as obras de regularização do rio Mondego, em particular a construção da barragem de Girabolhos, que considerou fundamental num contexto de seca.
“Fazemos um forte apelo ao próximo Governo para que complete as obras de regularização do rio Mondego com as verbas disponibilizadas no PRR [Plano de Recuperação e Resiliência], muito particularmente com a construção da barragem de Girabolhos, fundamental para reforçar as reservas nacionais de água, um bem estratégico e vital, e para prevenir as cheias do Mondego”, sustentou José Manuel Silva.
Aludindo ao facto de as alterações climáticas agravarem o risco de fenómenos extremos como secas ou inundações, o Presidente da Câmara de Coimbra recordou que a construção daquela barragem chegou a estar prevista no projecto da obra hidráulica de regularização do rio Mondego, sendo também “fundamental para a reserva estratégica nacional de água”.
“A barragem de Girabolhos, com as outras duas barragens desenhadas para montante da Aguieira (Midões e Asse Dasse), permite duplicar a capacidade útil de regularização do Mondego e armazenamento de água, passando dos actuais 365 hectómetros cúbicos para 889”, sustentou, acrescentando que “há uma urgência em fazer esse plano acontecer”.
Texto: José Leite/ Lusa
Fotos: Nuno Pereira
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