JOVEM MANTÉM O HÁBITO DE ILUMINAR COM MOTIVOS NATALÍCIOS A LOCALIDADE ONDE NASCEU. NEM O FURTO DE DUAS RENAS O FIZERAM ESMORECER
Há sete anos que o João Abrantes mantem essa tradição, esse carinho e amor pelas suas raízes: na quadra natalícia, enche a aldeia onde nasceu há 26 anos, Percelada, de luzes, presépios, ilumina árvores, ruas, becos, o parque infantil no exterior da antiga Escola, pede aos vizinhos para colocar projetores para as estrelas brilharem nas fachadas dos prédios, decora a capela de São Cristóvão, o Santo padroeiro da localidade. E as pessoas gostam de ver todo esse colorido que torna as noites frias e solitárias mais quentes. Há quem se desloque de longe para ver esta aldeia Natal, há também quem ali vá com outros intentos mais obscuros, como foi o caso de furtar as duas renas que se encontravam no muro fronteiro da Escola, já prontamente substituídas por outras idênticas, numa oferta de uma tabuense, naturalmente revoltada com o sucedido ao ver o apelo do João na sua página do Facebook, denunciando o roubo.
Jovem simples, algo introvertido, mostra-se orgulhoso desse seu trabalho de semanas, praticamente sem ajudas:
“ Vi as iluminações nas cidades e como gosto desta época, quis transportar essa ideia para a aldeia onde nasci. Foi uma forma de tentar cativar as pessoas a virem cá, e, ao mesmo tempo, dar algum conforto e mais calor a estas gentes. Já somos cada vez menos, neste momento deve haver pouco mais de cem pessoas aqui a viver. Neste tempo de pandemia, já que não podemos fazer grandes festejos, tento dar mais alegria. Em cada ano que passa vou acrescentando mais uma rua a ser decorada, um pormenor novo”.
O povo tem ajudado nas despesas, assim como a Comissão de Melhoramentos, Comissão da Capela, a Junta de Freguesia e Câmara Municipal. “E também do meu bolso…este ano, o investimento ficou entre os 600 e os 800 euros, mais os acrescentos de luzes, tomadas, cabos para fazer ligações”, diz à nossa reportagem. Mas não se queixa este auxiliar de saúde na Santa Casa de Galizes, orgulhoso das críticas positivas que tem recebido dos seus vizinhos.
As quais nós próprios pudemos comprovar. Como foi o caso de Filipe que elogia as iniciativas do João Abrantes: “Tem boas iniciativas que deviam ser aproveitadas da melhor maneira possível. Só que as ajudas não são muitas e ele vai fazendo o que pode…Eu trouxe-lhe umas estrelas em cartão e umas gambiarras que tinha em casa. Mas o resultado é bonito de se ver. Sinto orgulho em viver nesta aldeia Natal e, principalmente, as crianças gostam de ver. A minha Ana anda sempre a pedir-me para eu dar uma volta pelas ruas para lhe mostrar as luzes”, diz, rindo-se, olhando para a filha, acabadinhos de chegar de uma volta pelo fundo do povo.
Há quem se revolte com o roubo das renas. “Não se admite estragarem aquilo que os outros andam a fazer. Eu até disse ao João que ele era maluco para andar a ter todo esse trabalho, porque há muitas pessoas que não merecem”, diz-nos um outro morador. Nascida e criada em Percelada, Emília Fernandes, 67 anos, mostrou-se surpreendida com o “regresso” das renas furtadas: “Até pensei que os autores do roubo se tivessem arrependido e voltassem a colocá-las no lugar. Acho muito boa essa iniciativa, só demonstra a grandeza do seu caracter, a sua bondade. Esta aldeia era triste nesta época e, agora, é uma alegria ver todo este aparato, esta beleza. Ainda hoje um bombeiro que me levou para a fisioterapia me disse: Percelada já parece a vila de Tábua”.
A mãe do João, a Dona Rosa Maria com quem falamos junto ao autêntico presépio, quase mágico, instalado no pátio de sua casa, denotando o orgulho que tem pelo filho, pela sua iniciativa: “Desde pequeno que ele gostava de fazer estas decorações de Natal. Começou a ver o que faziam em Tábua e noutras localidades e quis que a sua aldeia também fosse igualmente bela”. Só lamenta os ataques dos “amigos do alheio”: “Este ano foram as renas, no ano passado, as luzes de umas árvores. Isto é gozar com quem trabalha”.
Mas, como diz a canção, não há machado que corte a raiz ao objetivo do João: dar brilho à escuridão que normalmente rodeia a sua aldeia, tornando-a mais aprazível nesta quadra em cada ano que passa. Não será este o verdadeiro espírito de Natal?
Texto: José Leite
Fotos: Nuno Pereira
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