NATURAL DE SINDE, AUGUSTO MACEDO FOI O TAXISTA MAIS VELHO EM ATIVIDADE EM LISBOA AO VOLANTE DO SEU OLDSMOBILE CABRIOLET.CHEGOU A SER ESTRELA DE CINEMA E GENTE NOTÁVEL, COMO FOI O CASO DE FERNANDO PESSOA E PABLO PICASSO, CIRCULOU NA VIATURA QUE FOI CAPTADA AO ABANDONO NUM PARQUE CAMARÁRIO
Augusto Macedo, natural de Sinde, Tábua, foi considerado na década de noventa o taxista mais antigo de Lisboa, ao volante de um Oldsmobile Cabriolet, importado dos EUA, tendo percorrido ao volante dessa viatura mais de dois milhões de quilómetros.Trabalhou em Lisboa de 1928 a 1996, faleceu com 93 anos, e o seu nome ficou para sempre imortalizado numa rua da capital, na freguesia de Carnide. Muitos se recordarão ainda de o ver a trabalhar ao volante da sua viatura, única na praça, que se encontrava muitas vezes estacionada no Rossio, “a guardar a estátua de D. Pedro”, segundo ele contava, sendo muito requisitada por turistas que encomendavam os seus serviços (muitas vezes, com várias semanas de antecedência), para dar uma volta original pela cidade e nos concelhos vizinhos.
Augusto Macedo veio para Lisboa em 1916 aos doze anos para trabalhar numa padaria onde um irmão mais velho era sócio. Aos 24 anos pediu dinheiro emprestado e comprou o famoso Oldsmobile Cabriolet, modelo XT 303, fabricado em 1928 pela General Motors. Desta série apenas três viaturas vieram para a Europa e as outras duas já desapareceram. O motor e a grande maioria das peças continuam a ser as de origem, com exceção dos pneus, que foram trocados pelos de um Chandler ainda mais antigo, de 1923. O carro de matrícula AB-61-86 de caixa aberta apresenta um motor de 6 cilindros, com 2745 cm3 de cilindrada e 11 cavalos de potência. Era o senhor Macedo que fazia a manutenção. Não lhe era imaginável trocá-lo por qualquer outro e, por isso, recusou, indignado, nos anos 60, uma proposta da General Motors que lhe oferecia um carro novo em troca do seu no intuito do mesmo integrar a coleção da companhia. Chegou a contar que, antes do 25 de abril de 1974, recusou uma proposta milionária vinda do estrangeiro, oferecendo naquela época 120 mil escudos.
Constituiu uma clientela fiel, portuguesa e estrangeira, com a qual criou fortes laços de amizade. Chegou a transportar três gerações da mesma família. Entre os seus clientes contaram-se os escritores Fernando Pessoa e Virgílio Ferreira, além do famosíssimo pintor, Pablo Picasso.Pessoa declamava-lhe os seus poemas e Virgílio Ferreira, referindo-se à provecta idade tanto do táxi como do seu condutor, comentaria a brincar com as letras da matrícula do carro: “Não sei quem será mais velho. O AB da chapa deve indicar Antes de Babilónia”…
O táxi tornou-se uma personagem histórica da cidade. Em 1996 foi a vedeta do filme Taxi Lisboa, do realizador alemão Wolf Gaudlitz, onde Augusto Macedo conquistou, aos 93 anos, o prémio de melhor actor amador atribuído no Festival de Pescara. O velho AB-61-86 sobreviveu, sem nunca ter sofrido um acidente, ao seu proprietário, falecido em Janeiro de 1997, precisamente no dia em que estreava em três salas de Lisboa o filme que interpretara. Nesse ano, em que caducava a sua carta de condução, Augusto Macedo era o mais antigo taxista do mundo ainda no ativo. Em 1998, a Associação Turismo de Lisboa adquiriu o velho táxi, assegurando a sua conservação na cidade e a sua utilização para fins de promoção turística.
Mas não deixa de se estranhar que sendo este táxi paticamente património da cidade de Lisboa, surja referenciado no blogue do Movimento Fórum Cidadania como estando praticamente ao abandono num parque da Câmara Municipal, onde foi fotografado. Conta a esse respeito Carlos Azevedo, um lisboeta amante da capital e que ficou indignado ao ver o estado de abandono em que se encontrou o velhinho Oldsmobile, num registo datado no final de 2020:
“Escrevo-lhes como cidadão, amante de automóveis antigos e lisboeta, para vos dar nota da minha indignação face ao que aparenta ser mais um caso de incúria e/ou profundo desrespeito no tratamento do património público.
Passo com regularidade junto às instalações da Câmara Municipal de Lisboa nos Olivais e já tinha reparado no conjunto de viaturas antigas, aparentemente recuperadas, deixadas ao abandono e à chuva (…)
(…) Olhando com mais atenção, uma viatura em particular, escondida debaixo de uma capa, suscitou-me maior curiosidade.
A forma quadrada fez-me crer que seria uma viatura bem mais antiga que os restantes que deverão ser dos anos70/80.
(…) Tive a confirmação dos meus piores receios.É o táxi do Sr. Augusto Macedo!
O Oldsmobile de 1928 do documentário “Táxi Lisboa”, vencedor do Festival de Cinema de Pescara 1996, de “Lisbon Story” de Win Wenders, de “Casa dos Espiritos”, do “Rei das Berlengas” de Artur Semedo, entre tantas outras presenças.
Que transportou Fernando Pessoa, Pablo Picasso, a fotógrafa alemã Leonore Mau, e o escritor Português Vergílio Ferreira.
Deixado a apodrecer na rua em pleno inverno!
Como é isto possível?
É este o respeito pelo património público e pelo dinheiro dos contribuintes que com toda a certeza foi gasto na sua recuperação?”.
Dado estar em causa o espólio de um tabuense exemplar, popularizado em todo o mundo, não seria oportuno a edilidade de Tábua interessar-se pelo destino dado ao antigo táxi, contactando, para o efeito, a sua congénere lisboeta? E, quem sabe, promover um evento na Biblioteca com a exposição da própria viatura, dignificando Tábua e dando a conhecer aos mais novos a vida de Augusto Macedo? Aqui fica a sugestão…
Fotos: CML – Comissão de Toponímia, 1999/ Carlos Azevedo no Blogue Movimento Fórum Cidadania
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